Por que no calor tomamos café e no inverno não tomamos sorvete? ‘Ah, mas eu tomo!’ Ok, você e eu talvez sejamos exceções. Mas convenhamos, é muito mais natural alguém te convidar para tomar um café no verão do que um gelato num frio de 15°C.
Inclusive, estava próximo do café da tarde — ali pelas quatro e meia — quando cheguei à Natugel. Poucos minutos depois, chega Guilherme Cardoso Inácio, de 21 anos. Alguém como eu, um pária sorvetístico.
Fone no ouvido, uniforme da empresa, ele entrou e foi se servir. Duas bolas de sorvete de menta. “Consumo bastante no inverno, não só no inverno”, contou. Pelo horário, questionei se aquele era um hábito diário. “Não é meu café da tarde, não, de vez em quando, uma vez por semana, eu passo por aqui e tomo um sorvete”, explicou ele, que trabalha na Protege, próximo ao estabelecimento.
Para além de quem consome, como é a vida de quem depende da venda destes insumos gelados para sobreviver? Quais os desafios e estratégias para vencer o inverno e se manter? Afinal, faz mal tomar sorvete no inverno? Continue lendo e conheça as histórias do sorveteiro da Avenida Marcolino Martins Cabral, no Centro de Tubarão, da indústria de sorvetes Natugel e o que dizem uma nutricionista e um pneumologista sobre o consumo desses produtos no inverno.
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Trinta anos na avenida
Em agosto deste ano, a Sorveteria Cidade Azul completa trinta anos. Ela é gerenciada pelo casal Manoel dos Passos Bittencourt e Marlete de Bittencourt Silveira; naturais de Imaruí, eles já vivem há três décadas na cidade. Eles mantêm o espaço aberto no inverno e garantem: o movimento diminui, bastante.
“O movimento cai bastante. O segredo do sorvete é o sol, se estiver frio mas com sol, a gente até consegue vender, mas nublou, fica difícil”, explica Manoel. “A gente trabalha o que pode no verão e aproveita para guardar um trocadinho para o inverno. Ficamos sempre abertos, eu gosto de estar aqui batendo um papo com o pessoal”, afirma.
A sorveteria é o único ganha-pão do casal, que já foi aconselhado a intercalar: venda de sorvetes no verão e de outros produtos no inverno. “A turma fala para eu montar um cachorro-quente aqui durante o frio, mas eu não gosto de misturar as coisas. Eu aproveito esses três meses de frio também para passear, tiro uns dias de férias para viajar com a esposa, porque a vida não é só trabalhar”, diz.
Aos 65 anos, Manoel conta que a clientela já é conhecida. “Tem algumas pessoas que se mudam e quando voltam se espantam que eu ainda estou aqui. Outras frequentavam aqui quando crianças, que vinham no colo da mãe; hoje, elas trazem os filhos”, relembra. E por falar nisso: o casal criou Maciel e Marcelo, seus filhos, com a renda do sorvete.
“Eu sou aposentado, mas não penso em parar de trabalhar, tanto pela vivência quanto pela amizade que tenho com as pessoas da cidade. Enquanto Deus me der saúde e força eu tô aqui”, conclui.
“Vendemos outros produtos para manter rentabilidade”
Desde 1995, a Natugel atua em Tubarão fabricando desde picolés à sorvetes. “Estamos preocupados em preservar uma receita única com produtos artesanais e frutas naturais”, explica a gerente administrativa da Natugel Katiane Backes. Sobre o período de inverno, ela afirma que as vendas encolhem e que tentam amenizar a situação com ações na própria empresa.
“A gente procura dar férias aos funcionários neste período de baixa de vendas e também buscamos vender outros produtos no inverno, como algodão doces e crepes para manter a rentabilidade”, conta. “No momento a gente ainda não tem o caminhão frigorífico, mas quem sabe para a próxima temporada seja uma ótima oportunidade”, afirmou quando questionei se eles teriam estratégias para o frio; foco em determinados tipos de venda ou exportação para outros estados.
“A dificuldade da Natugel eu diria que é justamente o fato de ser uma empresa sazonal, essa baixa de vendas neste período… Mas as oportunidades são muitas. A compra desse terreno, os investimentos e claro, a própria cidade de Tubarão que é o berço da Natugel”, conclui.
Sorvete dá gripe?
Com a chegada do inverno, é comum ouvir que tomar sorvete dá gripe. Mas será que isso é verdade? Afinal, o sorvete, por ser gelado, poderia mesmo causar uma gripe? Conversamos com um pneumologista e uma nutricionista para saber a verdade por trás do sorvetinho gelado no inverno.
“O sorvete não provoca gripe. A gripe é causada por vírus, especialmente o vírus da influenza, e não por alimentos gelados como o sorvete. O que pode ocorrer é que o consumo de algo muito gelado irrite temporariamente a garganta, provocando um leve desconforto ou a sensação de garganta arranhando — o que algumas pessoas confundem com o início de uma gripe ou resfriado. Se a imunidade estiver baixa, a exposição ao frio, como ambientes refrigerados ou o consumo frequente de alimentos gelados, pode facilitar a ação de vírus já presentes no ambiente. No entanto, isso não é a causa direta da infecção”
Filipe Viana Correa, Pneumologista do Complexo Médico Provida
“A gripe vem por um vírus, não é o alimento que vai gerar uma gripe ao paciente. No inverno nosso corpo sente mais frio, então muitas pessoas adaptam: comer frutas quentes com sorvete, um bolinho quente com sorvete… A questão mais importante é observar que os industrializados por exemplo, são ricos em açúcar e gordura hidrogenada, o que, consumido em excesso, aumenta nossa resistência à insulina. É mais uma questão nutricional do que o alimento ser gelado”
Alice Cunha, Nutricionista do Complexo Médico Provida