Há 113 anos, marujos brasileiros se rebelavam contra o racismo e ameaçavam explodir o palácio presidencial.
Fazer-se ser ouvido. Essa frase pode carregar alguns pormenores redundantes, mas é falar sobre o óbvio. Como denunciar o racismo sem que a voz dos denunciantes sejam, de fato, ouvidas? O exemplo da Revolta da Chibata, ocorrida em 1910 na marinha brasileira, é um evento onde algumas situações chegam a tal ponto que, para ser ouvido, são necessários canhões; de oito encouraçados, para ser mais exato. Há 113 anos, a revolta comandada por João Cândido Felisberto, hoje herói nacional, mudou a realidade militar brasileira
Desde a Guerra do Paraguai, em meados de 1860 e 1870, a figura das forças armadas preenche um espaço muito impacto no imaginário brasileiro. O exército e a marinha, especialmente, passaram a ocupar um espaço de responsáveis pelo orgulho nacional e pela ordem. Com a Proclamação da República, em 1889, liderada pelas forças armadas, o Brasil passou a presenciar no começo do século vinte um governo mais militar do que civil, conhecido como República das Espadas (quando nos referimos aos dois primeiros presidentes). Também, várias revoltas ocorreram pela mudança de poderes, como a Revolta da Vacina, a Revolta de Canudos etc. Porém, agora o Brasil era um país sem escravidão onde todos eram iguais perante a lei, não é mesmo? Bem, não é bem assim. E se eu disser que, basicamente, negros passariam, em dado contexto, receber para apanharem?
Ainda no começo do século XX, a população negra do Brasil vivia em um estado inferior economicamente em relação a população branca, por conta da recente influência da escravidão.
Logo, muitos jovens negros se alistavam nas forças armadas como forma de renda. No entanto, o código militar vigente na época previa castigos físicos aos marinheiros que cometessem delitos. No entanto, esses castigos eram bem seletivos; geralmente eram os negros que eram castigados, e na maior parte das vezes através de chibatadas. Uma espécie de castigo escravista requentado. Em dada ocasião, um marinheiro negro chamado Marcelino Rodrigues Menezes foi sentenciado a 250 chibatadas, não resistindo e vindo a óbito. Isso desencadeou um motim de grandes proporções nos principais navios militares brasileiros - estima-se que mais de 2 mil marujos participaram da rebelião exigindo o fim dos castigos físicos. Com uma boa organização, os rebeldes conseguiram ser ouvidos pelo presidente da época, Hermes da Fonseca, que se recusava a dialogar com os amotinados. Como fizeram isso? Bem...
O título resume bem a ação escolhida pelos amotinados. O movimento foi organizado para impedir que um cerco reprimisse a rebelião, além dos encouraçados amotinados atacarem pontos estratégicos do governo brasileiro. É bom lembrar que, na época, o palácio presidencial era o Palácio do Catete, no Rio de Janeiro. Ou seja, próximo ao litoral. Logo, uma das ações dos rebeldes foi, simplesmente, apontar os canhões em direção ao palácio em um ato de pressão a Hermes da Fonseca. O resultado? Os castigos físicos foram extintos e os amotinados perdoados (os do primeiro motim, já que outro fora organizado momentos depois).