Há 10 meses na cadeia, João Teixeira de Faria, conhecido como João de Deus, passou por exames clínicos e psiquiátricos no Tribunal de Justiça de Goiás, que revelam o atual estado de saúde dele - físico e mental. O Fantástico teve acesso aos laudos com exclusividade. Neles, os peritos da Justiça afirmam que João de Deus, de 78 anos, não sofre de nenhuma doença mental e que não possui câncer, contrariando o que o preso disse há 10 dias, ao deixar uma audiência, em Anápolis.
Durante a perícia, João de Deus, que está preso no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia, na Região Metropolitana, disse aos médicos que passou a sentir dores no quadril direito e no joelho direito desde que foi para a cadeia, e que, às vezes, aparece sangue em sua urina. Também relatou que desmaiou e caiu diversas vezes, e que está usando bengala. Ainda segundo ele, o apetite diminuiu consideravelmente.
De acordo com os médicos, a perda de peso é normal, já que ele apresentava sobrepeso antes da prisão. Eles afirmam, ainda, que João de Deus possui pensamento claro e coerente, com capacidade de raciocínio plenamente preservada.
O laudo médico da Justiça concluiu que João de Deus não tem nenhuma condição física ou mental que o impeça de continuar na cadeia, já que os tratamentos necessários podem ser realizados com ele na prisão.
“Portanto, é possível, do ponto de vista médico pericial, que o sr. João Teixeira de Faria cumpra a pena em regime fechado, desde que seja lhe permitido se ausentar para acompanhamento ambulatorial com médico assistente para verificação das medicações psicotrópicas em uso diante dos fatores já elencados, e para reavaliação quanto às alterações cardiovasculares inespecíficas evidenciadas durante o exame físico médico pericial”.
O laudo psiquiátrico também é incisivo - afirma que "se não há doença mental, não há necessidade de tratamento e, consequentemente, não há necessidade de se recuperar de algo que nunca existiu”.
A defesa de João de Deus se disse surpresa com o resultado, que considera equivocado.
“O senhor João Teixeira vai morrer dentro do presídio. Nós visitamos o senhor João duas vezes na semana, e todas as vezes que vamos lá, ele está num quadro degenerativo pior. A unidade prisional não tem estrutura para receber um idoso de 78 anos”, disse Anderson Van Gualberto Mendonça, advogado de João de Deus.
Sobre a causa dos desmaios que João de Deus afirma estar tendo na prisão, a junta médica aponta que pode ter ligação com os remédios que ele toma na prisão. São pelo menos 14 para tratar, por exemplo, colesterol alto, dor no peito e depressão.
Já o laudo psiquiátrico afirma que João de Deus não sofre de transtorno depressivo e que está usando medicações de forma desnecessária, o que pode causar efeitos colaterais como tontura e dificuldade de urinar.
“Se está certo, se não está certo, isso aí deveria ser dirimido com os médicos da unidade prisional, porque eles são os responsáveis, eles têm a responsabilidade total para inserir ou retirar o medicamento”, disse o advogado Anderson Van Gualberto.
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública de Goiás (SSP-GO) informou que João de Deus está sob cuidados médicos de profissionais particulares desde o dia 22 de julho. Também disse que os dois médicos do estado que trabalham na cadeia afirmam que não prescreveram os remédios usados pelo preso.
A defesa deve pedir a realização de novos exames.
Realização da avaliação médica
A avaliação médica foi realizada no prédio do TJ-GO diante de três psiquiatras. João de Deus chegou ao local escoltado. Eram dois médicos e uma médica, peritos oficiais, encarregados de fazer um laudo sobre o estado mental do preso.
perícia foi feita em uma sala que se assemelha a um consultório, onde João de Deus permaneceu por mais de três horas.
No mesmo dia, ele também foi avaliado por outras duas médicas e um médico, responsáveis pela elaboração de um laudo clínico.
Médicos comentam laudos
De acordo com o psiquiatra Daniel Barros, do Hospital das Clínicas de São Paulo, o resultado do laudo mostra “o que é mais comum”.
“O laudo só mostra aquilo que é mais comum. A maioria dos criminosos não tem nenhum transtorno mental”, afirma.
O professor de clínica médica da Universidade de São Paulo (USP) Itamar de Souza Santos concorda com a avaliação médica de que João de Deus não precisa deixar a prisão.
“Simplesmente pelo fato de ter muitas doenças, a pessoa não precisa ficar hospitalizada”, diz.
Histórico de doenças
Em 2015, devido a um câncer de estômago, João de Deus passou por cirurgia e quimioterapia. Ele também já sofreu um infarto e precisou colocar quatro stents, próteses que evitam a obstrução dos vasos sanguíneos.
Em março deste ano, graças a uma liminar, ele saiu da prisão e ficou internado num hospital até junho, por conta de um aneurisma no abdômen.
Assim que ele voltou à cadeia, a defesa decidiu pedir à Justiça que ele passasse por uma perícia oficial.
Acusações e processos
João de deus é acusado de ter cometido abusos sexuais contra pelo menos 300 mulheres. Ele afirma que é inocente e que está pagando pelo que teria feito em vidas passadas.
"É uma dívida, É de Deus". E acrescenta: "Eu sei que Deus vai me olhar e a Justiça também. Eu confio na Justiça dos homens”, disse.
A maioria das vítimas de João de Deus afirma que sofreu os abusos na Casa Dom Inácio de Loyola, em Abadiânia, onde ele fazia os atendimentos.
Até o momento, João de Deus é réu em nove processos, que somados, envolvem cerca de 90 vítimas, segundo o Ministério Público.
“Nós ainda trabalhamos na hipótese de oferecermos várias outras denúncias. Isso porque pela quantidade de vítimas, nós não conseguimos produzir todas as denúncias do caso ainda”, afirma o promotor de Justiça Luciano Miranda Meireles.
Para o promotor, João de Deus deve permanecer na cadeia até o fim da vida.
“Nós podemos dizer que certamente ele passará os seus últimos dias na prisão”, conclui Luciano.